domingo, 30 de maio de 2010

O poder do templo do consumo.


Faz tempo que não posto neste espaço, desculpem-me pela demora, digamos que eu estava sobre a 'maré' de não sei o que postar. Mas hoje a noite, li um artigo de uma professora (Silvana Pintaudi) sobre os Shopping Centers, e resolvi discorrer um breve texto a respeito destes espaços de consumos tão comuns, hoje em dia, nas nossas vidas de urbanóides perdidos no tempo e espaço.

Primeiramente, quero deixar claro que o Shopping Center, assim como o Supermercado, é um espaço concentrador de territórios e capital. What?! Falando em português claro, esses locais onde compramos as nossas roupas, presentes para os familiares e outros, em que saboreamos um bom e calórico fast-food, ou seja, onde torramos o nosso $$$ é na verdade uma junção, em apenas um lugar, das lojas de roupas que haviam no centro, das joalherias que se concentravam na rua principal da cidade, dos cinemas que em outrora eram a diversão e espaço de namoro nas áreas centrais urbanas e dos restaurantes das mais diversas culinárias nobres, além das redes extrangeiras de fast-food com grande apelo marqueteiro. No que se refere a concentração de capital ($$$ e bens), subentendemos que a concentração territorial dos mais diversos tipos de lojas, restaurantes e cinemas, etc., implica numa grande concentração de dinheiro em um espaço determinado, o próprio Shopping.
Nossa, que coisa mais óbvia não?! Pois é, também acho, mas você nunca pensou que um Shopping Center pudesse ser um espaço que redesenhasse as relações sociais entre as pessoas?
Vou explicar. Antigamente, as pessoas das classes menos favorecidas às muito favorecidas, costumavam comprar o tecido para se fazer a vestimenta numa loja de tecidos, geralmente localizada no centro. Quando se queria uma roupa de griffe, recorria-se a um costureiro famoso, ou seja, a roupa com nome da alta costura lhe garantia status. O antigo centro da cidade era especializado em atender a todos os tipos de classes econômicas e sociais, ocorria a "misturança" do rico e do pobre na mesma calçada, e o Shopping Center, a princípio, vem para mudar isso com a intenção de atrair as pessoas mais endinheiradas e da classe média. E o resto?! É resto! Que continuem consumindo na 25 de Março da vida, no Saara da pqp e da 13 de Maio dos infernos.
Sim, o 1º Shopping Center do Brasil, o Iguatemi, se instalou em São Paulo, no ano de 1966, próximo a Avenida Paulista e a Rua Augusta (rua das lojas de griffes, hoje em dia das meretrizes), a intenção dos empreendedores era atrair o público chic e sofisticado do centro de São Paulo, o objetivo foi alcançado, e logo as áreas ao redor do Iguatemi, que eram residenciais, começaram a se valorizar e foram sendo compradas por bancos, e para a construção de edifícios vesticais (prédio de vários andares), o poder público teve que agir e melhorar as vias de acesso ao Shopping, portanto, dinheiro público foi gasto para melhorar o acesso aos clientes ricos e aumentar o lucro dos donos do estreante templo de consumo em terras tupiniquins.
Como vimos, o Shopping separou o joio do trigo, pobres e ricos, mas vamos ressaltar a data, o Iguatemi foi construído em 1966, porém os Shoppings começaram a se espalhar pelo Brasil somente na década de 1980, exatamente "a década perdida" (tempo de crescimento econômico baixo ou negativo). Eita! Como?! Se o Brasil tava numa crise econômica ferrenha na década de 1980, e Shopping é lugar de gastar dinheiro, como é que ele se espalha para outros lugares? Meninos e Meninas, não sejamos ingênuos, a crise brasileira só aconteceu nas classes menos favorecidas por $$$, enquanto que a as classes ricas pouco sofreram, para melhor exemplificar colocarei um trecho da Pintaudi:

"É nessa situação socioeconômica (década perdida), que surgem e desenvolvem os Shopping Centers no Brasil. À primeira vista, uma contradição, quando se sabe que a maior parte da sociedade é constituída de pobres e miseráveis, sem a menor condição de participar com a riqueza criada [na década de 1970, no chamado "milagre brasileiro", quando o país chegou a crescer a taxas de 11%]. Mas esses 'templos' não foram construídos para a grande maioria, e sim para poucos que se situam em estratos mais elevados. Pensando bem, falar em 20% da população economicamente ativa detendo 64% da renda nacional (riqueza do país), em 1986, estar falando em mais de 20 milhões de brasileiros, o que não é um mercado desprezível"

Na década de 1990 em diante, o poder dos Shopping Centers se tornaram tão forte, pois, o processo de concentração e centralização do capital se tornou maior, que eles monopolizaram a distribuição das mercadorias e passaram a ditar o preços e a dar ordens para as indústrias produtoras de suas mercadorias. Com esse domínio econômico, os SC começaram a abranger as classes menos abastadas, mas não as miseráveis, a massificação do consumo ocorre graças à multiplicidade de mercadorias criadas para atender aos mais variados grupos, volto a repetir: menos os pobretões.
O consumidor já não é mais o comprador de 50 anos atrás, ele, cada vez menos, compra um produto que lhe dê status, mas para que lhe dê prazer, pois ele é bombardeado de propaganda na TV e nas ruas, sofre uma lavagem cerebral, que o leva a consumir, os Shopping Centers passam a adaptar o seu ambiente para criar uma esfera de felicidade. Hoje em dia, o lazer das pessoas de cidades grandes e médias é ir pro Shopping. Parques? Praças? Museus? Teatros? Que nada, o Shopping é a diversão do momento, o templo do consumo, o casa de oração do religioso rico e emergente consumista. O lugar da alienação.
Para finalizar acrescento estas palavras do saudoso Milton Santos no livro "Globalização e Agricultura" da autora Denise Elias:

"Historicamente, o consumo transformou-se no verdadeiro ópio, substituindo gradativamente o tradicional papel desempenhado pelas religiões. Enquanto estas se alicerçam na fé para difundir seus códigos de convivência social, o consumo instala sua fé por meio de objetos, que são a própria ideologia, quer pela sua presença imediata, quer pela promessa ou esperança de obtê-los um dia. O poder do consumo é tão contagiante que passa a representar um papel motor e perverso na sociedade atual, transitando pelo próprio aprendizado e condicionamento social do consumo. O consumo tem sua própria força ideológica e material, alimentado-se das práxis individuais e coletivas experimentais no processo cotidiano de vida: o trabalho, a casa, o lazer, a educação, a saúde, etc."